Resenha
do livro “Os Corumbas” de Amando Fontes.
*Gladston
Oliveira dos Passos
Lançado em julho de
1933, o livro “Os Corumbas” foi escrito por Amando Fontes (advogado, jornalista
e deputado estadual em 1946). Além dos Corumbas, Fontes escreveu outro livro:
Rua do Siriri. Mesmo escrito em 1933, Os Corumbas perdura como uma história
atual, onde o trabalhador se esforça, porém continua na mesma miséria. O
romance de Amando Fontes teve aprovação unânime ao ser publicado, a narrativa
conta a história da família Corumbas, que se deslocam do povoado Ribeira,
localizado no interior de Sergipe para Aracaju, a saída dos Corumbas para
Aracaju, ocorre devido a seca de 1905 e com a baixa do açúcar que veio agravar
mais a situação.
“Os
usineiros e senhores de engenho reduziram à metade o jornal da sua gente e
passaram a pagar a tonelada de cana por tal preço, que nem valia à pena
plantá-la”
(FONTES,
1979, p. 9-10)
A ideia de sair do
pequeno povoado partiu de Sá Josefá, esposa de Geraldo do Corumba; Sá Josefá acreditava
que na capital tudo iria melhorar.
“Na
capital, havia emprego decente para as duas meninas mais velhas. Era nas
fábricas de tecidos. Estavam assim de moças, todas ganhando bom dinheiro...
Pedro não custaria em conseguir um bom lugar, como ferreiro ou maquinista...
Uma outra vida, enfim.”
(FONTES,
1979, p. 10)
Os sonhos de Sá Josefá,
ao longo da narrativa são engolidos pelos efeitos perversos da vida na cidade.
O romance de Amando Fontes é dividido em três partes. A primeira se passa em
Ribeira, e narra a história do agricultor Geraldo Corumba, que se apaixona por
Sá Josefá (meio loira, os olhos claros e fulgentes) conhecida como “ a flor da
casa” Ao fim de dois anos eles se casaram, viveram dezessete anos na Ribeira e
tiveram cinco filhos, quatro moças e um rapaz; Antes de migrarem para a
capital, todos trabalhavam.
“Uma
das raparigas chegava a fazer quatro mil réis por semana, como botadeira de
cana na moenda, a mais velha se ocupava em ralar a mandioca de todos os
roceiros do lugar, recebendo, como paga, entre dez a quinze litros de farinha
preparada. O rapaz, que exercera já uma meia dúzia de empregos, servia agora
como auxiliar do maquinista do Engenho. Até as duas menores sempre faziam
alguma coisa, ajudando em casa ou na roça”
(FONTES,
1979, p. 9)
Porém com a vinda da
seca, e o declínio da produção canavieira, a família Corumba parte para
Aracaju, a partir daí, inicia a segunda parte do romance, onde se desenvolvem
os elementos centrais da narrativa, mostrando a família situada há algum tempo
na capital. O filho Pedro, jovem de dezoito anos, cabelos alourados, trabalhava
como ajudante de torneiro nas oficinas de Estrada de Ferro, situadas muito
longe, no bairro do Aribé, hoje conhecido como Siqueira Campos. As duas filhas
mais velhas, trabalhavam, assim como Geraldo, na fábrica de tecidos. Albertina,
segunda filha do casal, morena clara, olhos negros e vivos, um grande corpo bem
feito e Rosenda, a mais velha de todas, morena, cabelos pretos escorridos, o
rosto pontilhado de espinhas, baixa e grossa. A jornada de trabalho é discutida
por Fontes contemplando as diferentes percepções das personagens à exploração
da força de trabalho barata nas fábricas de tecido.
“Dentro
daquela ondulante massa humana movia-se uma rapariga muito branca, de treze
anos apenas. Era um frangalhozinho de gente, delgada como um vinte, a carne, de
tão sem sangue, transparente, os lábios arroxeados de frio, chamava-se Clarinha
e servia, como ajudante, na seção dos teares da Sergipana, venando o ordenado
de quatrocentos réis por dia”
(FONTES,
1979, P. 21)
As esperanças dos
Corumbas estão depositadas todas na escolarização das duas filhas mais novas
(Bela e Caçulinha).
“Sentada
no batente da porta do quintal, Caçulinha estudava, muito atenta, a sua lição
lia em voz alta, convencida de que assim decoraria mais depressa. Era uma
garota de onze anos, olhos claros, cabelos castanho-loiros, branca rosada. Tudo
isso e mais o catinado de sua pele, as suas mãos feias e belas, davam-lhe certo
ar de superioridade e destaque no meio pobre em que vivia. Constituía o enlevo
e a alegria dos dois velhos. Era, mesmo, a máxima esperança deles. Porque,
aquela, não levaria a dura vida das irmãs, arrastando sacrifícios e
impossíveis, haveriam de fazê-la normalista e professora, para ter quem lhes fosse
um amparo no extremo da velhice”
(FONTES,
1979, p. 23- 24)
Rosenda, a filha mais
velha conhece um rapaz:
“Chamava-se
Inácio dos Santos. Era mulato disfarçado, de compleição hercúlea, altura média.
Tinha os cabelos duros e cresados, cuidadosamente repartidos bem no meio da
cabeça, olhos baços, raiados de sangue na esclerótica, nariz grosso. A boca,
continuamente arregaçada, num riso cínico e desdenhoso, deixava à mostra dois
largos dentes de ouro”
(FONTES,
1979, p.38)
O namoro do Cabo Inácio
com Rosenda não era aprovado pelos pais. Diante disso, e do rancor que Rosenda
tinha por viver dessa forma, decide então fugir e abandonar a família. Pedro
inicia uma amizade com um intelectual (José Afonso) que lhe introduz textos de
Lênin e Pedro acaba se tornando comunista, se junta a um grupo de
revolucionários e provoca uma grave geral na capital, os grevistas foram presos
e deportados para o Rio de Janeiro. A partir daí, Sá Josefá coloca Bela para
trabalhar na fábrica para ajudar as despesas da casa, porém Bela, sempre foi
fraca de saúde e assim que adentra nas fábricas a sua situação piora.
“Bela
deixou o serviço às duas horas e dirigiu-se logo para caras, queixando-se de
fortes dores pelo corpo, as mãos e as faces escaldantes, uma tosse seca e
impertinente a torturá-la”
(FONTES,
1979, p.80)
Bela passa um mês sem
trabalhar e Caçulinha sugere a mãe que também comece a trabalhar nas fábricas
porque ela não tem roupas, com a situação financeira precária, Caçulinha começa
a trabalhar na fábrica, passado alguns dias Bela chega a falecer.
“Houve
lágrimas, mas foi uma dor tranqüila, sem lamentações nem desesperos, sentiam,
mesmo, uma espécie de alívio por causa deles. Mais pela que se fora, pois
descansava, afinal”.
(FONTES,
1979, p. 104)
Desde que Bela estava
doente, Albertina se engraçava com o
Médico que cuidava de sua irmã, conhecido como Fontoura e acabou seguindo o
mesmo rumo da sua irmã.
“Era
a segunda filha que viam a prostituição arrebata-lhes. Porém, dessa vez, a
impressão da desonra lhes foi muito mais viva e acubrunhante. Se Rosenda
fugira, fizera-o com um homem de condição igual à sua. Isso se dava a cada
instante. Poderia acontecer a todo mundo. De relação à Albertina, no entanto,
fora bem diferente o que se dera. Ela havia deixado a casa de seus pais para
sair em companhia de um ricaço. Certo, entre eles nunca teria sido levantado a
hipótese de algum dia se casarem, o interesse, portanto, apenas o desejo de se
vestir melhor, trabalhar menos, tinham-na arremessado aos braços dele..”.
(FONTES,
1979, p. 123)
Porém, Fontoura
sentiu-se cansado de Albertina e abandonou-a, ela acabou se mudando para a Rua
do Siriri, principal centro de prostituição. Depois de seis meses da greve que
havia acontecido na capital, Pedro havia mandado uma carta para seu pai onde
dizia:
“Agora
estou trabalhando na Gazeta, foi o único jornal que me aceitou, depois da greve
que eu já mandei contar em outra carta. Tive de me sujeitar a um ordenado de
esmoler”.
(FONTES,
1979, p.142)
Caçulinha, que havia
ido trabalhar na Fábrica para ajudar nas despesas de casa, começou a namorar
com o Sargento Zeca, durante muito tempo, ele iludia Caçulinha com falsas
promessas de casamento, os dois ainda noivaram, porém não passou disso,
Caçulinha ficou pressionando Zeca para se casar, mas isso não ocorreu, Zeca
tirou sua virgindade e acabou não casando com ela. A fábrica não aceitava as
mulheres que trabalhavam na seção do escritório, que não tivessem vida honesta,
Caçulinha junto com sua mãe chegou a ir à delegacia, porém Zeca teve uma prisão
preventiva. A partir daí, a única solução de Caçulinha foi ficar com um homem
casado e sair de casa, esse fato finaliza a segunda parte.
Na terceira e última
parte do romance, Sá Josefá vai visitar Caçulinha e informa que voltara a morar
na Ribeira junto com Geraldo.
“Há
seis anos tinham vindo, tão cheios de esperança... A cidade, com o ganho das
fábricas, o casamento para as meninas, o professorado de Caçulinha, fora tudo
ilusão, que por água abaixo descerá. Melhorar?... Não o conseguiram nunca.
Perderam mesmo, o único bem que possuíam: os filhos, desgarrados por esse
mundo, a outra morte, afastados de todos do seu convívio...”.
(FONTES,
1979, p. 171)
Portanto, o que vale
ressaltar na história de Amando Fontes é o meio social utilizado na sua obra,
como um espaço de injustiça, opressão e ubiqüidade, tudo isso é englobado na
vida dos Corumbas, na esperança de melhorar de vida, sofrem com as condições
impostas pela modernização que busca uma civilização voltada para o progresso.
*Acadêmico do curso de
História Licenciatura pela Universidade Federal de Sergipe.
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